Qual o projeto de país definido pelo arcabouço? *Gilberto Maringoni* outraspalavras.net/mercadovsd… Leia com atenção!

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Página IncialArtigos e discursosAbertura do 15º Congresso Internacional do Trigo. Outubro de 2008.

Abertura do 15º Congresso Internacional do Trigo. Outubro de 2008.

Antes de mais nada, as boas-vindas do Governo do Paraná às senhoras e aos senhores participantes deste l5º Congresso Internacional do Trigo. O Paraná sente-se gratificado em tê-los aqui, na terra brasileira do trigo.
De fato, se hoje somos o maior produtor nacional, fomos, no remoto passado colonial, um dos primeiros pontos onde se plantou trigo na América do Sul. Alguns historiadores paranaenses chegam mesmo a reivindicar essa primazia. E teria sido daqui que o trigo espalhou-se pelo continente, inclusive à Argentina.
Pelos três séculos do Brasil Colônia, cultivou-se trigo no Paraná. Essa informação é recorrente nas anotações de autoridades, cronistas e viajantes que nos visitaram no período. Às vésperas da Independência, o botânico francês Auguste Saint-Hilaire, em sua longa viagem pelo Brasil, de passagem pelo Paraná, deixa um minucioso registro sobre o plantio do trigo e louva “o pão bem branco e muito saboroso” feito nos Campos Gerais.
É ainda Saint-Hilaire que nos dá notícia da ocorrência, também aqui, da praga da ferrugem, de que já se queixavam nossos produtores.
A produção de trigo no Paraná, à época da visita do naturalista francês, não se volta apenas ao consumo local.
Colhia-se o bastante para atender também outras regiões do país; a Província de São Paulo, principalmente, de que éramos Comarca.
No entanto, com a transformação das fazendas dos Campos Gerais em áreas de cria e engorda de gado, integrando-se ao atraente “Ciclo das Tropas”, ao mesmo tempo em que a cata e a industrialização da erva-mate transformam-se em atividade altamente lucrativa e faz eclodir outro o ciclo, o do Mate, abandona-se a produção de trigo, que mal sobrevive como cultura de subsistência.
Tanto é assim que o nosso primeiro governante, depois da nossa emancipação de São Paulo, o Conselheiro Zacarias de Góes e Vasconcellos, no relatório à Assembléia Legislativa de l854, lamentando a parca produção agrícola da nova Província, pondera: “(…) O trigo particularmente, que há não muitos anos aqui se cultivava em quantidade que excedia o consumo do povo e se exportava, é lastimável que esteja agora quase abandonado”. E conclamava o Paraná a “fazer os últimos esforços para restituir a esse primeiro dos cereais a prosperidade de que já gozou e aumentá-la quanto for possível”.
E aos que atribuíam à ferrugem o declínio da produção, o Conselheiro ironizava, apontando a verdadeira causa: a febre provocada pelos altos ganhos da erva-mate. Dizia ele: “(….) não é logo, tanto, a ferrugem, como a erva que faz mal ao trigo”.
De pouco adiantou a advertência do Góes e Vasconcellos. Se não desapareceu de todo, a produção de trigo diminuiu fortemente durante o ciclo ervateiro e só volta a ocupar algum espaço com a chegada dos imigrantes europeus, no final do século l9 e início do século 20. Uma produção quase que inteiramente voltada ao consumo paranaense.
De qualquer forma, a preocupação oficial com a produção de trigo no Paraná não desaparece. Assim, em l920, quando se criam no país duas estações experimentais para a pesquisa do trigo, uma delas é a Estação Experimental de Ponta Grossa, reconhecendo-se a importância do Paraná para a retomada da produção do cereal.
Aí por volta dos anos 30, quando o Ciclo do Mate dá claros sinais de esgotamento, há novos incentivos oficiais à produção de trigo. Note-se que, nas três primeiras décadas do século passado, a população paranaense dobrara e a demanda por alimentos pressionava fortemente uma agricultura pouco desenvolvida, pouco atrativa face à prosperidade do extrativismo ervateiro e, depois, madeireiro.
No entanto, com o formidável avanço da cafeicultura sobre as terras roxas do Norte do Estado, nos anos 40 e 50, galvanizando capitais, atenções e energias, o trigo, como de sorte outros produtos primários, apenas satelitiza a tal da rubiácea. E, cada vez mais, amassamos o nosso pão de cada dia com trigo argentino, americano ou europeu.
O trigo paranaense –de resto a triticultura nacional, já que sempre fomos maiores produtores, mesmo na baixa- só volta a atrair os agricultores e a atenção do Governo com o fim do ciclo cafeeiro, abatido tanto pelas sequentes geadas quanto pelos preços e concorrência internacionais.
O estímulo à diversificação da agricultura e a colonização do Oeste e do Sudoeste do Paraná dão um novo e forte impulso ao cultivo. O grande salto acontece a partir da segunda metade dos anos 60. E temos aí o binômio soja-trigo. A ampliação do espaço ocupado pela soja significa também o alargamento da área cultivada de trigo.
Assim, se, no final da década de 60, a área plantada com trigo ocupava 287 mil hectares, tendo como resultado uma colheita de 283 mil toneladas, no final dos anos 70, a área cultivada ultrapassa a l milhão e 400 mil hectares, com o Paraná colhendo l milhão e 300 mil toneladas do cereal, a metade da produção nacional.
Anote-se que nos meados dos anos 70 acontece uma grande e desastrosa geada, que dizimou não apenas as lavouras mas também gerações de cruzamentos em campos experimentais e o próprio trigo semente.
A maior área semeada e, em consequência, a maior produção verifica-se na segunda metade dos anos 80, quando o Paraná colhe mais de três milhões de toneladas de trigo, novamente 50 por cento da produção brasileira.
Com o aumento de recursos à pesquisa agrícola, verificam-se ganhos notáveis em produtividade. Algumas cooperativas paranaenses têm, em anos sequentes, médias superiores a 2 mil e 500 quilos por hectare. Há relatos de produtividade superior a 5 mil quilos por hectare, em lavouras extrordinariamente bem cuidadas.
Registre-se que na safra deste 2008, a produtividade média da triticultura paranaense bateu novo recorde, 2 mil 650 quilos por hectare.
Entre os anos 70 a meados dos 80, a produtividade estava aí em torno de l mil l39 quilos por hectare. E quando tivemos a grande safra de 86/87, a nossa produtividade alcançou 1 mil 894 quilos por hectare. Veja-se, então, o quanto avançamos.
É claro, a par disso, desenvolve-se no Paraná um consistente parque moageiro, interrompendo o tão falado, à época, “passeio do trigo”, quando o grão paranaense era enviado para ser industrializado em outros estados, voltando aqui como produto dos outros, com a consequente perda fiscal, entre tantos prejuizos.
Enfim, com este breve relato da trajetória do trigo no Estado, quis afirmar, marcar que o trigo faz parte da história paranaense, desde os primórdios da colonização portuguesa. São cinco séculos de avanços e recuos e queremos que, daqu
i para frente, possamos contar apenas a história dos avanços.
Para tanto, apresento aqui algumas idéias a fim de que ao Paraná alavanque a produção de trigo e conduza o Brasil à autosuficiência do cereal.
Neste ano, colhemos 52 por cento da safra nacional e temos, potencialmente, todas as condições de produzir muito mais, chegando até mesmo a seis milhões de toneladas.
Como?
Não é preciso mover mundos e fundos. Com algumas medidas bem encaixadas, vamos dobrar a produção.
Em circunstâncias como as de hoje, quando o espectro da crise já tolda e embaraça a economia global, e a recessão dá os primeiros sinais de vida, precisamos fazer mão de toda sorte de incentivos, meios, idéias, parcerias para aumentar também a produção de alimentos. Logo, esta é boa hora para discutir uma nova política para o trigo.
Qualquer plano deve envolver o Governo do Estado, o Governo Federal, os agricultores, as cooperativas, os moinhos, a indústria do trigo; ou os elos desta cadeia engrenam-se e movimentam-se adequadamente ou uma única falha produz engasgo geral.
De sua parte, o Governo do Paraná elenca aqui algumas propostas e propósitos.
Estudamos cooparticipar da subvenção do valor do prêmio pago pelos produtores para o seguro agrícola do trigo, contribuindo assim com a redução do custo de produção e com o acesso ao crédito rural.
Vamos negociar mais enfaticamente com a União para que se disponham aos nossos produtores de trigo instrumentos de política agrícola em apoio à comercialização, como a Aquisição do Governo Federal, a AGF, e o Empréstimo do Governo Federal, o EGF, com ou sem opção de venda; além de uma linha especial de crédito.
Queremos também a redução das tarifas do transporte de cabotagem, para que o trigo possa ser posto a preços competitivos nas regiões Norte e Nordeste do país.
Outra medida que reivindicamos é a adoção de remuneração ao produtor que, no mínimo, cubra o custo variável da lavoura, hoje estimado em 29 reais e 34 centavos por saca.
Não temamos a defesa firme dos subsídios, como alguns alucinados defensores pátrios do livre mercado morrem de medo, mesmo porque, por mais que subsidiamos, pouco é, uma ninharia, diante do que fazem os governos dos ditos países desenvolvidos.
Na área fiscal, o Governo do Paraná já proporciona uma série de incentivos nas operações internas de venda ao consumidor, como a alíquota zero de ICMS. Para os fabricantes de farinha de trigo, e para as demais unidades da Federação, existe um crédito presumido que varia de 5 a 10 por cento sobre o valor da saída.
Ainda na área fiscal, cite-se a medida de redução de imposto que tomamos, para restabelecer o equilíbrio, depois que São Paulo zerou o imposto de importação do trigo, favorecendo a Argentina e prejudicando os paranaenses.
O passeio do trigo a São Paulo cessou mas, de vez em quando, criam uma espécie de sucedâneo, a que sempre vamos contrapor, em defesa de nossos produtores, da nossa indústria e dos consumidores. E do Brasil. Enfim, tudo o que proteja e estimule o produtor paranaense, na busca do aumento da produção e da autosuficiência, faz-se em favor dos brasileiros.
Sempre que preciso e sempre que possível, nos limites de nossa competência, vamos praticar uma política fiscal agressiva, incisiva, protecionista.
Em contrapartida, queremos a indústria firmemente engajada nesse esforço. Firmemente, parceiramente integrada à produção, comprometendo-se a comprar as colheitas por um preço justo. Gostaríamos de ver os moinhos contratando a compra da produção nacional antes da safra.
Acredito que os moinhos entendam perfeitamente que o avanço da triticultura depende muito de sua colaboração.
Oferecemos ainda a garantia aos nossos produtores de que o Governo do Paraná continuará investindo em pesquisas e experimentos, colocando à disposição variedades de trigo cada vez melhores, mais resistentes, mais produtivas.
Ainda em junho passado, o nosso IAPAR lançou dois novos cultivares, que apresentam desempenho superior a outros no mercado.
Enfim, temos tudo para um novo salto produtivo, para escalar mais um degrau em direção à autosuficiência. Temos clima e solo altamente favoráveis, temos estrutura de armazenagem, temos a eficiência de nossos agricultores e das cooperativas, temos um parque moageiro bem montado e com capacidade de receber bem mais produção.
As condições estão dadas. Precisamos agora estabelecer e fechar um pacto, na busca da segurança alimentar de nossos cidadãos. E segurança alimentar é autosuficiência também na produção de trigo. Afinal, o consumo brasileiro de trigo, por ano, é de 10 milhões e 750 mil toneladas e a produção nacional alcança pouco mais de 50 por cento disso.
A nossa dependência do trigo importado exacerba-se ainda mais com a entrada de novos consumidores no mercado, com a melhoria das condições de compra dos brasileiros. Os números são fantásticos. Vejam: em 2003 importamos 24 mil e l76 toneladas de farinha de trigo. Em 2007, ano passado, as importações pularam para 625 mil 729 toneladas. Quase tudo da Argentina.
Na verdade, com os nossos vizinhos e irmãos latino-americanos não queremos uma competição predatória, uma guerra. Queremos complementaridade, integração. Queremos que a busca da segurança alimentar para o nosso continente seja uma frente comum.
Da nossa parte, da parte do Governo do Paraná, insisto, não faltarão medidas fiscais, de apoio técnico, de infraestrutura para amparar e impulsionar o aumento da produção.
Temos a melhor terra, o melhor clima, a melhor assistência técnica, as melhores variedades, a melhor infraestrutura e, sobretudo, o melhor agricultor.
Contamos com 53 moinhos e uma capacidade de armazenagem de 24 milhões de toneladas. Uma infraestrutura que comporta um fortíssimo incremento da produção.
O que temer então?
Vamos ao debate. Vamos à busca dos caminhos que nos conduzirão a tão desejada autosuficiência. Contem com o Governo do Paraná. Tenham a certeza da nossa absoluta imersão nesta causa.
Obrigado.