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Considerações sobre a PEC 55 ex-PEC 241

Prezado Companheiro,
Opusemo-nos à PEC 55 ex-PEC 241 por considerarmos que ela partia de uma análise incorreta da crise brasileira.

Apresentamos uma proposta suportados pelas lições históricas que mostram o insucesso das políticas de austeridade na Grécia e em todo sul da Europa nos anos recentes, assim como, pelo sucesso das políticas de recuperação econômica contra a depressão na Alemanha, nos EUA, do New Deal, entre outras experiências.

Nossa proposta foi sequer ouvida na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, por receio de que ela pudesse convencer os senadores de que há alternativas muito melhores para o país do que a PEC 55.

Como temos certeza do insucesso catastrófico da PEC 55, e reconhecendo nos colegas senadores o senso de dever, responsabilidade, patriotismo e sentimento de solidariedade com nossos irmãos e irmãs brasileiras que não possuem as mesmas alternativas de sobrevivência de que dispomos, tomamos a liberdade de trazer a vosso conhecimento a nossa proposta e justificativa para sua leitura e considerações.

Com respeito, e reconhecendo nossas limitações estou aberto a opiniões e sugestões.

Com abraço

Senador Roberto Requião
PMDB/PR
EMENDA Nº            – CCJ (SUBSTITUTIVA)

PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 55, DE 2016

Altera a Constituição Federal, para estabelecer regras e princípios com o objetivo de retomar o crescimento econômico com redução das desigualdades sociais e regionais e dá outras providências.

AS MESAS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS E DO SENADO FEDERAL, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Art. 1º A Constituição Federal passa a vigorar com as seguintes alterações:

Art. 145. ……………………………………………….

§ 3º A criação e a alteração de tributo deverá obedecer ao princípio da progressividade, ficando vedada qualquer forma de regressividade. (NR)

……………………………………………………………..

Art. 162-A. As finanças públicas terão como princípios fundamentais:

I – a promoção do crescimento econômico e do desenvolvimento;

II – a geração de emprego e a dinamização do mercado interno;

III – a estabilidade fiscal, garantida a adoção de medidas de caráter anticíclico;

IV – eficiência Tributária;

V – igualdade de oportunidades;

IV – a redução das desigualdades sociais e regionais.

………………………………………………………………………..

Art. 165.……………………………………………….

§ 10.Qualquer medida restritiva de política fiscal não poderá ter duração superior ao período do plano plurianual em que começar a vigorar. (NR)

………………………………………………………………..”

Art. 170.……………………………………………….

X – irredutibilidade do gasto social real per capita.

………………………………………………………… (NR)

…………………………………………………………..

Art. 191-A. A condução das políticas monetária e cambial deverá obedecer simultaneamente aos seguintes princípios:

I – promoção do crescimento econômico e do desenvolvimento;

II – estímulo à industrialização do País;

III – geração de emprego;

IV – solidez das contas externas;

IV – estabilidade de preços.

………………………………………………………..”

Art. 193.………………………………………..

Parágrafo único. Qualquer alteração que reduza os direitos previstos neste Título deverá ser submetida a referendo, nos termos do art. 14, inciso II. (NR)

.………………………………………………………………..”

Art. 2º Acrescente-se os seguintes arts. 101 a 103 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

Art. 101. Será assegurado mecanismo que garanta aumento real do salário mínimo, sempre que houver crescimento econômico, até o pleno atendimento das necessidades vitais do trabalhador e às de sua família, estabelecidas no inciso IV do art. 7º.

Art. 102. No prazo máximo de um ano a contar da promulgação desta Emenda Constitucional, entrarão em vigor as legislações previstas ou necessárias para atender ao estabelecido nos seguintes dispositivos:

I – art. 153, VII;

II – art. 172;

III – art. 192.”

Art. 3º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data da sua publicação.

Sala da Comissão,

JUSTIFICATIVA

A proposta que ora apresentamos tem como princípio fundamental recuperar a capacidade de implementar política econômicas com amplos objetivos, e não apenas com a meta estreita e exclusiva da estabilidade fiscal e estabilidade monetária. Estabilidade dos preços e sustentabilidade fiscal deve ser um meio, para algo mais importante, e não o fim. As políticas econômicas devem ser guiadas para o crescimento econômico, o desenvolvimento, a justiça social e a redução das desigualdades regionais e sociais. Ademais, devem ser racionais e permitir a flexibilidade imprescindível para lidar exitosamente com as inevitáveis oscilações do ciclo econômico.

A Constituição é a guardiã dos princípios fundamentais que devem nortear toda a gestão da política econômica. Grande parte das alterações que propomos visa justamente definir e explicitar os princípios fundamentais que devem reger as principais políticas econômicas. Sem congelamentos e sem inflexibilidades irracionais.

O governo Temer apresentou a PEC nº 55, de 2016, como a solução miraculosa para diversos problemas presentes atualmente na economia brasileira. Em especial, a PEC tem sido apresentada como a resposta à piora no resultado fiscal e ao aumento do endividamento público, e que, ainda seria uma condição necessária e suficiente para recuperação econômica. Dizem alguns, inclusive, que a PEC traria mais benefícios aos mais pobres e que mais precisam do Estado. Conforme já argumentamos neste voto, nenhuma dessas afirmações se sustenta.

Na realidade, a PEC em comento, além de inconstitucional, está baseada em um diagnóstico econômico errado e, consequentemente, não irá resolver nem o problema fiscal, nem a recuperação do crescimento econômico, muito menos reduzir o desemprego.

Desde 2015, a economia entrou numa espiral negativa, um círculo vicioso, em que cortes de gastos sucessivos têm levado à piora do resultado primário e não à melhora, como se gostaria, ou se pretendia.

Isto porque, diante da forte desaceleração econômica, os cortes de gastos, em especial dos investimentos públicos, têm gerado novas reduções do crescimento e consequentemente da arrecadação, piorando cada vez mais o resultado fiscal.

Ao concentrar todo o ajuste nas despesas primárias federais, a PEC não aborda os dois principais fatores explicativos da nossa situação fiscal, a saber, a queda da arrecadação federal e o aumento do pagamento de juros e, sendo assim, não permitirá quebrar o círculo vicioso que se instaurou na economia brasileira, que seria a única forma de permitir uma recuperação econômica mais acelerada.

Além disso, a PEC em comento contém uma proposta de mudança estrutural na economia brasileira, que diz respeito a uma redução sistemática do Estado, baseada também em um diagnóstico errado de uma situação que é conjuntural e não estrutural, como gostam de afirmar.

Dos 89 países analisados pelo FMI, em 2014, apenas 29 tinham alguma regra fiscal de gasto. Desses 29 países, apenas dois tinham constitucionalizado essa regra: Cingapura e Geórgia. E, mesmo assim, nesses países, não eram regras de congelamento real dos gastos. No caso dos demais países que adotaram alguma regra fiscal (de dívida ou de resultado fiscal), nem 5% dos países tinham alguma regra constitucional. Como vimos neste voto, dos cinco países que adotam um teto efetivo de gastos, nenhum o constitucionalizou. Nesses outros países, o teto é estabelecido politicamente e têm a duração dos governos democraticamente eleitos.

O grande problema de se constitucionalizar um instrumento tão poderoso quanto o limite do gasto público e, assim, colocá-lo num piloto automático, é abrir mão, pelos próximos 20 anos de qualquer intervenção do Estado, na esfera econômica.

Saliente-se que, desde a crise de 2009, os países têm discutido uma revisão das regras fiscais. Nas décadas de 1990 e 2000, regras fiscais rígidas foram adotadas em diversos países, mas, desde 2009, percebeu-se a necessidade de se ter maior flexibilidade, na condução das políticas fiscal e monetária.

As chamadas regras fiscais de segunda geração têm como base alguns princípios fundamentais: reduzir a prociclicalidade, para permitir que o governo atue na direção contrária a de famílias e empresas, em especial em momentos de recessão; aumentar a flexibilidade, ao prever cláusulas de escape para situações atípicas, em especial baixo crescimento e alto desemprego; ter capacidade de mudar política fiscal, de acordo com as conjunturas, e jamais deixá-la engessada por longos períodos; e assegurar mecanismos de transparência que permitam a sociedade conhecer a situação fiscal e evitar tentativas de burlar as regras.

Ora, a proposta apresentada na PEC nº 55, de 2016, vai na contramão das melhores regras fiscais existentes hoje na economia mundial. Com a aprovação da PEC-55, será constitucionalizada uma regra contracionista, uma vez que os gastos governo federal crescerão sempre abaixo do Produto Interno Bruto, sem qualquer cláusula de escape, ou seja, sem qualquer possibilidade de mudança na condução da política, seja qual for a situação econômica nacional e mundial e seja qual for o governo eleito.

Não importando se o crescimento do PIB esteja fraco, se o desemprego esteja alto e se a renda das famílias e o lucro das empresas estejam em declínio, o Governo Federal não poderá, de forma alguma, contribuir para que a economia saia dessa situação, nos próximos 20 anos.

Isso porque, mesmo após os 10 primeiros anos, o único ajuste possível será no fator de correção dos gastos primários federais, sem poder excluir qualquer gasto ou mesmo prever novas regras. Além dessa limitação, durante a tramitação da PEC na Câmara, as regras para a possibilidade de alteração após 10 anos foram apertadas, de forma que só será possível alterar uma única vez o teto, e por projeto de lei complementar, não mais lei ordinária. Ademais, foi mantida a condição de que o único ajuste possível será sobre o índice de correção do limite dos gastos.

Assim, pelos próximos 20 anos, teremos uma regra fixa, cristalizada na Constituição, de modo que, independentemente do governo eleito, independentemente da situação econômica, a política fiscal já estará definida.

Ora, a flexibilidade e a capacidade de se adaptar às diferentes conjunturas são vitais para a condução exitosa de qualquer política econômica, seja ela procíclica ou anticíclica. Contudo, a PEC em comento, ao criar uma draconiana rigidez fiscal que terá de ser mantida por 20 anos, independentemente do que venha a ocorrer na economia internacional ou nacional, introduz uma insustentável irracionalidade na gestão econômica do Brasil.

De fato, é completamente irracional se gerir despesas independentemente do comportamento das receitas e do PIB. Segundo alguns cálculos, poderemos chegar ao final do período de vigência da PEC, fazendo inacreditáveis superávits primários de 7% do PIB, sem poder investir em serviços públicos essenciais para o bem-estar da população e sem poder estimular os investimentos necessários ao desenvolvimento do país. No mundo inteiro, ninguém faz uma loucura dessas.

E ninguém o faz por uma razão que é óbvia, ou que deveria ser óbvia: as previsões econômicas são muito falhas. Ninguém sabe ao certo o que vai acontecer com a economia brasileira ou mundial daqui a três ou cinco anos, quanto mais daqui a vinte anos. Lembre-se que, às vésperas do colapso de 2008, as agências de risco classificavam os papéis do Lehman Brothers como “Triplo A”. Meses depois, o banco faliu. Ninguém, ou quase ninguém, conseguiu prever a crise mundial que já dura 8 anos. Os cenários econômicos futuros são sempre incertos, daí a necessidade absoluta da flexibilidade das regras e das políticas. A PEC nº 55, de 2016, é a negação obtusa dessa realidade básica da ciência econômica moderna.

Entretanto, se somarmos essa alteração na política fiscal à atual forma de condução da política monetária, que desde 1999, pelo menos, passou a ser guiada por um único objetivo, a estabilidade dos preços, estaremos abrindo mão de realizar políticas econômicas, de qualquer natureza, em especial àquelas para recuperar o crescimento econômico e promover o bem-estar da população.

Observe-se que a Constituição já tinha previsto que as finanças públicas seriam geridas por meio de lei complementar.  No que tange as regras fiscais, a Lei de Responsabilidade Fiscal já disciplinou diversos aspectos da política fiscal, mas jamais impôs aos governos eleitos a definição da política fiscal. O que precisamos fazer é aprimorar a LRF e não constitucionalizar novas regras, impondo limites nunca antes testados ou estabelecidos em qualquer período do nosso regime democrático, nem mesmo em qualquer país. Para atingir o equilíbrio fiscal, não precisamos de aventuras estapafúrdias.

Nesse sentido, a proposta ora apresentada visa assegurar a possibilidade de que governos futuros, democraticamente eleitos, possam gerir a economia e, em especial as finanças públicas e as políticas monetária e cambial, na forma escolhida pela sociedade brasileira. Bem como assegurar que não haverá retrocessos nas conquistas sociais já definidas desde a Constituição de 1988.

Em primeiro lugar, há uma alteração no Capítulo do Sistema Tributário Nacional para assegurar que a criação e a alteração de qualquer tributo irá obedecer ao princípio da progressividade, ficando vedada qualquer forma de regressividade. Procura-se aqui garantir que novas alterações tributárias contribuam para uma melhor distribuição de renda, procurando reverter o caráter ainda muito regressivo do nosso sistema tributário, fortemente baseado em tributação sobre bens e produção, além de ter grandes e crescentes isenções fiscais na tributação das rendas mais altas.

Dessa forma, criamos as condições para a ampliação justa das receitas, com o objetivo econômico de se obter o equilíbrio fiscal com um crescimento harmônico da arrecadação, que incida sobre os setores mais abastados da sociedade e sobre segmentos que hoje gozam de isenção fiscal, e com o objetivo social de aliviar o peso dos encargos que hoje recaem, de forma excessiva e injusta, sobre os setores populares.

No capítulo das Finanças Públicas procurou-se inserir um artigo de princípios fundamentais, que garantissem que a condução das políticas fiscais será regida pelos seguintes princípios: a promoção do crescimento econômico e do desenvolvimento; a geração de emprego e a dinamização do mercado interno; a adoção de medidas de caráter anticíclico; eficiência Tributária; a igualdade de oportunidades; e a redução das desigualdades sociais e regionais. Em grande parte, torna-se constitucional algo que estava inclusive na base da LRF: a política fiscal deve simultaneamente ser utilizada para garantir a sustentabilidade da dívida, o equilíbrio macro e promover o desenvolvimento econômico e social.

Com o objetivo de garantir a soberania do voto popular e flexibilidade das políticas, estabeleceu-se que qualquer medida restritiva de política fiscal, em especial, as que limitam a capacidade de atuação dessas políticas, não poderá ter duração superior ao período do plano plurianual (PPA), período já definido pela Constituição como o de um ciclo orçamentário. Assim, qualquer meta a ser estabelecida, deverá se ater ao período do PPA.

Para evitar medidas que promovam um retrocesso social e distributivo, propõe-se que dentro dos princípios gerais da atividade econômica seja incorporado o princípio da irredutibilidade do gasto social real per capita, justamente um dos principais objetivos negativos da PEC nº 55, de 2016. E, combinado a isso, propomos que qualquer medida que reduza os direitos sociais protegidos na Constituição deveria ser submetida a referendo popular.

A condução das políticas monetária e cambial também foi incorporada à proposta da PEC e deverá obedecer simultaneamente aos seguintes princípios: a promoção do crescimento econômico e do desenvolvimento; o estímulo à industrialização do País; a geração de emprego; a solidez das contas externas; e a estabilidade de preços. O objetivo dessa proposta é que dois preços fundamentais de qualquer economia, como câmbio e juros, não possam ser geridos com um único objetivo. Diversos bancos centrais do mundo adotam o chamado duplo mandato. Desse modo, essas variáveis fundamentais são geridas de forma a garantir, simultaneamente, crescimento e estabilidade de preços.

Com isso, estamos contribuindo à geração das condições objetivas para assegurar a volta do crescimento econômico, que é a melhor maneira de se conseguir o equilíbrio fiscal.

Além dessas mudanças propostas no texto constitucional, foram incorporados também dois dispositivos aos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, visando acelerar o processo de recuperação econômica.

Uma modificação importante é a que visa evitar uma das propostas mais regressivas da PEC, que é a vedação do aumento real do salário mínimo. A constituição, no inciso IV do art. 7º, definiu que o salário mínimo deveria atender as necessidades vitais do trabalhador e às de sua família e elencou diversos elementos para tal. Assim, deverá ser assegurado mecanismo o que garanta aumento real do salário mínimo, sempre que houver crescimento econômico, até o pleno atendimento dessas necessidades vitais. Nos últimos anos, a regra de aumento real do salário mínimo mostrou-se um importante dinamizador da economia e um bom vetor de redistribuição de renda.

Finalmente, estabelece-se um prazo máximo de um ano para entrar em vigor as legislações previstas ou necessárias para atender ao estabelecimento do Imposto sobre grandes fortunas, a regulação da remessa de lucros para exterior bem como a lei complementar da regulação do sistema financeiro nacional.

Trata-se aqui de iniciativas legislativas que, no nosso entendimento, serão fundamentais para conciliar a busca do equilíbrio fiscal com o crescimento econômico, a justiça social, a soberania popular e o imprescindível respeito aos direitos sociais consagrados na Constituição Cidadã de 1988.