Página IncialNÃO A BERNARDO FIGUEIREDORequião questiona recondução de Bernardo Figueiredo e transforma sabatina em diligência

Requião questiona recondução de Bernardo Figueiredo e transforma sabatina em diligência

A Comissão de Infra Estrutura do Senado aprovou por unanimidade, nesta quinta-feira, 22, proposta do senador Roberto Requião de transformar em diligência a sabatina para a recondução de Bernardo Figueiredo à direção-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres, ANTT. A proposta de recondução de Figueiredo é do Governo Federal e Requião apresentou um relatório paralelo à CI apondo-se à indicação.

Senhores Senadores
Senhoras Senadores
Desta Comissão de Infraestrutura

É meu dever trazer fatos ao conhecimento do Senado a respeito do senhor Bernardo Figueiredo, os quais, se seriamente considerados à época de sua sabatina, deveriam levar à rejeição de sua indicação para a importante de função pública de Diretor Geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT. À época eu não era Senador. Era governador do Paraná. E como governador, levei os fatos à Casa Civil da Presidência. Mas, foi como se não tivesse levado. O senhor Bernardo Figueiredo, então assessor da Casa Civil, foi logo depois indicado para dirigir a ANTT.

Seu mandato como Diretor Geral da ANTT não tinha como dar certo. Como, de fato, não deu certo. Ao menos para o Brasil. Deu certo, como se temia, para as concessionárias privadas, das quais o senhor Bernardo Figueiredo se origina e as quais representava diretamente quando era personagem privado e que continuou beneficiando como agente pública. É um típico caso de agente público-privado.

Eu já apresentei alguns destes fatos da Tribuna do Senado por duas ocasiões este ano. Mas, ao que parece, não provocaram a devida reflexão no governo, tanto é que aqui estamos diante da possibilidade concreta de termos o senhor Bernardo Figueiredo reconduzido ao cargo de Diretor Geral da ANTT.

Pois bem. Acrescento agora outros, levantados pela Procuradoria Geral da República. Vejamos se com estes novos dados, o Senado se sensibiliza e atua na defesa da sociedade, impedindo que o senhor Bernardo Figueiredo seja reconduzido ao cargo de Diretor Geral da ANTT.

O Senado não pode deixar de considerar a Representação do Procuradoria Geral da República contra a ANTT ao Tribunal de Contas da União Nº 16848-2011-1, que, neste ato, entrego à Presidência desta Comissão para as devidas diligências. Ministério Público Federal. Observe-se que não se trata de uma iniciativa isolada e açodada de um Procurador da República, mas de uma medida tomada pela Procuradoria Geral da República, por meio de sua 3ª Câmara de Coordenação e Revisão. A Representação em questão consolida anos de investigação do Ministério Público Federal em todo o país, realização de seminários, audiências públicas, intervenções em processos judiciais. É assinada pelo Subprocurador Geral da República Antonio Fonseca e por quatro procuradores federais, de diversas unidades da Federação, integrantes do Grupo de Trabalho Transportes da Procuradoria Geral da República.
A Representação é o retrato da ação concertada entre as concessionárias privadas e o senhor Bernardo Figueiredo contra os interesses dos usuários, a sociedade, a Nação brasileira.

Vejamos o que diz a Procuradoria Geral da República:

“ 1. Introdução – as irregularidades do transporte ferroviário de carga
Dilapidação do patrimônio da extinta RFFSA
São inúmeros e recorrentes os casos de dilapidação do patrimônio da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. pelas concessionárias do serviço público de transporte ferroviário de cargas. A dilapidação é de toda ordem e repete-se em vários Estados da Federação e em inúmeros trechos ferroviários, seja em relação aos bens imóveis ou móveis arrendados, seja em relação a materiais rodantes ou estruturas e superestruturas utilizados pela concessionária para a exploração do serviço público concedido.
Descumprimento de contratos de concessão
Os contratos de concessão/arrendamento são sistematicamente descumpridos pelas concessionárias. Elas não cumprem as cláusulas contratuais a que se obrigaram há mais de uma década; prestam serviço público de transporte ferroviário em absoluta dissonância com as regras pactuadas com o Estado, constituindo flagrante violação à Lei de Concessões e à Constituição Federal.
O Poder Concedente silencia e omite-se de forma inaceitável. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) não se tem desincumbido a contento de sua tarefa de regulação e fiscalização.
Na falta de efetivo controle, as concessionárias como que se apropriam do negócio do transporte ferroviário de carga como se fosse próprio; fazem suas escolhas livremente, segundo os seus interesses econômicos. O quadro é de genuína captura, em que o interesse privado predomina sobre o interesse público.
Escopo da representação
É esse o cenário, em rápidas palavras, que motiva a presente representação a essa Corte de Contas. As irregularidades são descritas a seguir. Ao final, roga-se a devida análise técnica dos graves desvios de finalidade demonstrados.
O escopo desta representação é obter desse Tribunal as providências adequadas à correção de rumo, dirigidas ao Ministério dos Transportes e à Agência Nacional de Transportes Terrestres. Mais do que isso, o Ministério Público Federal busca compartilhar as suas preocupações e produzir título que reforce a sua compreensão dos problemas e, assim, possa tornar mais consistente eventual pretensão jurídica, em juízo ou extrajudicialmente, no âmbito das suas atribuições.”

Mais adiante, a Procuradoria Geral da República relata o acumpliciamento do senhor Bernardo Figueiredo com a empresa da qual foi sócio, a América Latina Logística – ALL:

“Pois bem, se a concessionária dilapida – ela própria – ou abandona bens públicos arrendados, descumprindo durante mais de uma década cláusulas de contrato administrativo, por certo a Agência Reguladora tomou providências e exigiu soluções?

Não. Nada fez até agora. Não aplicou multas, não denunciou o contrato, não exigiu investimentos quaisquer para a restauração ou reposição da estrutura e superestrutura, bem como dos bens móveis e imóveis afetos ao transporte ferroviário.

O descumprimento contratual era e é manifesto. O abandono é tamanho que não só está comprovado pelas inspeções e fiscalizações, mas também pela própria sociedade da região, sendo fato notório o desmonte da ferrovia e a perda de milhões de reais de patrimônio público em face da desídia da concessionária e da omissão da concedente. Os Executivos Municipais (Prefeituras) e os representantes locais, regionais e federais da região (Vereadores, Deputados Estaduais do Estado do Rio Grande do Sul e Deputados Federais) têm conhecimento do malbaratamento e destruição praticados com a conivência do Poder Público Federal (ANTT e Ministério dos Transportes). “
A Procuradoria Geral da República obteve prova documental dos malfeitos do senhor Bernardo Figueiredo e da maneira aberta como afronta a Lei e às próprias Resoluções da ANTT para favorecer a ALL, empresa de que era sócio, o que levou à necessidade de representar contra a ANTT no Tribunal de Contas da União:
“A Carta/Ofício encaminhada pela ALL à ANTT merece transcrição literal:

“Em continuidade ao acordado nas reuniões realizadas entre essa Agência e esta Concessionária em 13/03/06, 30/03/06, 22/05/06 bem como demais entendimentos, vimos por meio desta, em atendimento a resolução nº 44 de 04 de julho de 2002, Título VI, artigo 2º, inciso VI, requerer a desativação definitiva do trecho ferroviário Santiago-São Borja”.

O acordo prévio – reconhecido pela própria concessionária – é sinal claro de que o requerimento foi a mera formalização de decisão conjunta tomada anteriormente e revela a política de total conivência e omissão da ANTT com relação ao abandono, destruição, invasão e malbaratamento dos bens públicos e, consequentemente, do transporte ferroviário como alavanca do desenvolvimento regional e nacional.

Acrescente-se que essa política da ANTT revela os motivos pelos quais a União Federal e a própria concedente não têm interesse em executar a astreintes milionárias (multa diária) aplicada pela Justiça Federal, ou, pelo menos, em envidar esforços para que a ré a cumpra. ”

Como se vê, para defender a ALL, o senhor Bernardo Figueiredo desrespeita até mesmo a Justiça Federal.

E, para que não reste qualquer sombra de dúvida aos senhores senadores e senadoras quanto à responsabilidade do senhor Bernardo Figueiredo pela dilapidação do patrimônio público, através de sua descarada cumplicidade com a poderosa concessionária privada ALL:

“Desse modo, a ANTT é responsável, além de outras determinações, pela fiscalização direta do cumprimento das cláusulas contratuais de prestação de serviços ferroviários e de manutenção e reposição dos ativos arrendados (inc. IV), além de contribuir para a preservação do patrimônio histórico e da memória das ferrovias, orientando e estimulando a participação dos concessionários do setor (inc. VII).
E disso não se tem desincumbido o ente regulador.
Dispõe o art. 77 da Resolução nº 3.192/2009 que aprovou o Regimento Interno e a Estrutura Organizacional da ANTT, que cabe à Gerência de Fiscalização, vinculada à Superintendência de Fiscalização, como atividade central “(…) fiscalizar as áreas sob a responsabilidade da Superintendência, emitindo os respectivos Autos de Infração – AI”.
Frise-se que anteriormente à alteração proporcionada pela Resolução nº 3.192/2009, a responsabilidade pela aplicação das penalidades de multa e advertência era da Superintendência Serviços de Transporte de Carga – SUCAR (Resolução nº 001/2002).
A responsabilidade é da Diretoria, sobretudo do Diretor-Geral a quem cabe a representação da ANTT e o comando hierárquico sobre pessoal e serviços (art. 26, da Resolução nº 001/2002). ” (grifamos)
É realmente grave a situação.

Se fosse somente omisso, ou como diz o MPF, leniente, já seria motivo suficientemente grave para que o senhor Bernardo Figueiredo fosse substituído no comando da ANTT. Mas a situação é ainda mais grave, senhoras senadoras, senhores senadores. É mais grave. A Procuradoria Geral da República constatou que o senhor Bernardo Figueiredo impede deliberadamente que os funcionários da ANTT multem a ALL. Isso mesmo. Os servidores públicos da ANTT foram proibidos expressamente de multar a ALL. Diz o Ministério Público Federal:

“A ANTT não autoriza seus agentes a emitirem diretamente Autos de Infração. […]
É flagrante a irregularidade/ilegalidade na determinação da SUCAR, que proíbe a emissão de Autos de Infração por Especialistas em Regulação da ANTT em desfavor das concessionárias ferroviárias, em descompasso com a legislação vigente que autoriza os Especialistas em Regulação de Serviços de Transportes Terrestres e Técnicos em Regulação de Serviços de Transportes Terrestres (Lei nº 10.871/2004) a lavrarem tal infração. ”

Ou seja, o senhor Bernardo Figueiredo, que a Presidente da República quer reconduzir ao comando da ANTT, com o aceite do Senado, age como um xerife. Mas não um xerife dos usuários, dos agentes econômicos, da sociedade e sim um xerife do capital privado, controlando com rédea curta e chicote na mão a Agência, o Estado brasileiro, para submetê-lo passivamente aos interesses das concessionárias privadas, em especial a ALL, empresa da qual era, até pouco tempo, sócio.

E para concluir este aspecto, vejam os senhores senadores e senadoras o que quer a Procuradoria Geral da República na representação ao TCU, no que se refere à ANTT:
“a) apuração da ausência de fiscalização e sobretudo de autuação/aplicação de penalidades pela ANTT às concessionárias, inclusive no que tange às determinações administrativas que contrariavam as próprias resoluções da Agência, tudo consoante o item 7 da presente representação;”

Eu mesmo fui testemunha da atuação do senhor Bernardo Figueiredo em favor da ALL. Em 2007, quando era governador do Paraná, recebi na residência oficial do estado o então ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e o Sr. Bernardo Figueiredo Gonçalves de Oliveira, à época assessor da Casa Civil da Presidência da República. Os fatos relativos àquela visita e as consequências que dela derivaram foram por mim relatadas em Representação que fiz ao Procurador Geral da República. Trata-se de outra representação, anterior àquela a que fiz referência há pouco e com respeito a fatos diferentes. Para não me alongar, entrego à esta Presidência e aos senhores senadores cópia da representação.

Na representação que fiz ao Ministério Público Federal anexei informações biográficas e das atividades, públicas e privadas, do Sr. Bernardo Figueiredo, acompanhante do ministro Paulo Bernardo na referida visita.
Há uma simbiose entre as atividades públicas e privadas do Sr. Figueiredo.
As informações que aqui relato foram colhidas no “curriculum vitae” que o Sr. Figueiredo apresentou a este Senado, em outubro 2008, quando sabatinado para ocupar o cargo de diretor geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres.
Em 1994, ele era chefe de gabinete do presidente da Rede Ferroviária Federal e participou dos estudos preliminares para a privatização da ferrovia. Ou seja, participou da formatação da privatização das ferrovias brasileiras.

Como formatou a privatização de maneira interessante, viu sua obra e achou que estava tão boa que deveria ele próprio participar da privatização para ganhar um bom dinheiro.

E foi o que fez. Em l995, ocupa a presidência da Interférrea S/A Serviços Ferroviários e Intermodais, uma empresa privada responsável por serviços auxiliares do transporte rodoferroviário, que participou dos leilões de privatização. E, talvez graças à eficiência do senhor Bernardo Figueiredo ou às informações privilegiadas de que dispunha, venceu dois leilões.
Quer dizer, em um ano, como funcionário público, arquiteta a privatização da Rede Ferroviária Federal; no ano seguinte, torna-se sócio de uma das empresas beneficiadas pela privatização por ele planejada.
Dos principais trabalhos para a Interférrea, destaca-se a sua participação na estruturação das concessionárias Ferrovia Centro Atlântica e da Ferrovia Sul Atlântica, que depois se transforma na ALL, da qual, posteriormente o Sr. Figueiredo vem a ser membro do Conselho Administrativo. Ou seja, ele estruturou a privatização no Estado. Em seguida, estrutura empresas para ganhar os leilões da privatização que ele próprio tinha estruturado.
Em, 1966, a Ferrovia Sul Atlântica, depois ALL, com a participação da Interférrea, presidida pelo Sr. Figueiredo, empresa da qual era sócio, arremata toda a malha ferroviária do sul do país. E, na seqüência, participam da privatização de outros trechos ferroviários. O resultado todos sabemos pela mídia e,especialmente, pelos levantamentos feitos pelos municípios, estados, Ministério Público, Justiça Federal: dilapidação do patrimônio público, prejuízo de bilhões aos cofres públicos, abandono de regiões inteiras ao atraso e à penúria. Isso tudo com a cumplicidade da ANTT, chefiada por quem? Bernardo Figueiredo. Ou seja, estruturou a privatização como agente público segundo os interesses do capital, participou dos leilões como empresário privado e fiscaliza os contratos como Diretor Geral da ANTT. O resultado é o quadro catastrófico que a representação da Procuradoria Geral da República ao TCU descreve. É este ser híbrido que a Presidência quer que o Senado da República reconduza ao cargo de Diretor Geral da Agência.

Entre 1999 e 2003, o Sr. Bernardo Figueiredo ocupa a direção executiva da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, o lobby das concessionárias privadas.
Como diretor da ANTF, o Sr. Figueiredo ganhou assento na COFER –Comissão Federal de Ferrovias do Ministério dos Transportes, precursora da Agência Nacional dos Transportes, a ANTT. Ou seja, ele, que estruturou a privatização como agente público e participou da privatização como agente privado, volta ao Estado, agora para estruturar o órgão de fiscalização dos contratos que ele criou como agente público e assinou como agente privado.
Em 2004, mais uma vez, o Sr. Bernardo Figueiredo transita do privado para o público, depois de transitar do público para o privado. Ele assume a Diretoria Administrativa Financeira da VALEC – ah! a famosa VALEC! – empresa pública vinculada ao Ministério dos Transportes, responsável pela construção de ferrovias federais. Lá fez parte da equipe do famoso Dr. Juquinha, recentemente defenestrado pela presidente Dilma por seus inúmeros malfeitos.
Na VALEC, o Sr. Figueiredo elabora o Plano de Revitalização das Ferrovias, centrado nas tais Parcerias Público Privadas, as PPPs, onde o governo entra com tudo e o empresário colhe os lucros. Foi com este Plano que ele, na companhia do Ministro Paulo Bernardo, quis que eu assentisse, na famosa visita dominical na residência oficial do governador do Paraná.

Trabalhou como Assessor do Ministro do Planejamento Paulo Bernardo, sempre buscando envolver o Estado brasileiro no seu Plano.

De 2005 a 2007 e com o mesmo propósito, Bernardo Figueiredo atua como assessor especial da Casa Civil e é nessa condição que o recebo na casa oficial do Governo do Paraná, em 2007.

E, incrivelmente, mesmo depois de eu ter relatado ao governo federal uma parte dos fatos que agora trago ao conhecimento do Senado, o senhor Bernardo Figueiredo foi indicado em 2008 para o cargo de Diretor Geral da Agência Nacional de Transporte Terrestre, a ANTT. O resultado de sua gestão é aquele descrito pela Procuradoria Geral da República ao TCU na representação que ora trago ao conhecimento de Vossas Excelências.

 

Trago também ao conhecimento do Senado o Relatório da CPI constituída na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo para “apurar a atual situação do sistema ferroviário do Estado de São Paulo”, que conclui pela leniência da ANTT em relação ao seu dever de fiscalizar a ALL e sugere a extinção do contrato de concessão. O Relatório, de lavra do deputado Mauro Bragato, do PSDB, não teve qualquer resultado prático. O senhor Bernardo Figueiredo recebeu o Relatório da CPI e fez o que sempre faz quando se trata de exercer o seu dever-poder de Diretor Geral em relação à ALL, empresa da qual era sócio: nada.

Trago também ao conhecimento de Vossas Excelências o contrato de concessão da ALL, firmado pelo senhor Bernardo Figueiredo como um dos seus sócios.

Estes os fatos, para não me alongar.

Espero o Senado da República não fique genuflexo diante de tanta barbaridade. Seria uma desonra para o Senado e para todos nós senadores e senadoras.